domingo, setembro 23

As estreias que valem a pena
27 de Setembro


FAY GRIM, de Hal Hartley

Estreias

STARDUST
Baseado no livro do brilhante Neil Gaiman e realizado por Matthew Vaughn (realizador de LAYER CAKE e produtor de SNATCH). Num mundo de fantasia, um jovem parte à procura de uma estrela que caiu à terra. Mas claro que tudo se começa a complicar, sobretudo quando Robert DeNiro faz o papel de um aeropirata homosexual. Também com Michelle Pfeiffer e Claire Danes. Crítica neste blog em breve. [Ler crítica]

FAY GRIM
A continuação de HENRY FOOL, também de Hal Hartley, FAY GRIM segue a personagem titular interpretada por Parker Posey enquanto ela desvenda um mistério a pedido da CIA. Aparentemente este filme é quase inteiramente filmado em ângulos oblíquos. Alguém gostou de BATTLEFIELD EARTH.

1408
Mais um filme baseado num conto de Stephen King. De Mikael Håfström (quem?), com Samuel L. Jackson e o adorável John Cusack. Nada do outro mundo, mas filmes de susto são uma coisa que nunca pode faltar no cinema.


Já em exibição

THE BOURNE ULTIMATUM
Parte final da trilogia de Paul Greengrass baseada nos livros de Robert Ludlum. Um filme de acção sem oleosidade, concessões ou arabescos. [Ler crítica]

O CAPACETE DOURADO
Filme português, o primeiro de Jorge Cramez, sobre os obstáculos ao amor entre dois jovens problemáticos. O realizador aparentemente gosta de utilizar a palvra "bombar". Crítica neste blog em breve. [Ler crítica]

SUPERBAD
Depois de KNOCKED UP e 40 YEAR OLD VIRGIN, Judd Apatow continua a tentar fazer vingar os dorks. O Napoleon Dynamite da época.

O Esquartejamento de GRINDHOUSE Parte 2
DEATH PROOF, de Quentin Tarantino



Ler Parte 1

Enquanto que PLANET TERROR foi um assalto ao mundo grindhouse, uma paródia sem distanciamento, DEATH PROOF é uma outra espécie de homenagem. Tarantino criou aqui não uma série de referências mas antes uma verdadeira reflexão sobre dois temas: filmes slasher e filmes de vingança.

A principal queixa de quem viu DEATH PROOF prende-se com o ritmo e com a falta de acção durante a maior parte da duração do filme. Mas o que acontece é que isso era mesmo um sintoma dos filmes grindhouse. Com o baixo orçamento que tinham, simplesmente não conseguiam financiar mais do que uma ou duas sequências de acção. Excertos dessas sequências perfaziam a quase totalidade da trailer, mas noventa por cento do filme eram personagens a conversar, normalmente em salas parcamente decoradas.

DEATH PROOF procura assim ser um filme de género autêntico, e logo ao princípio deparamo-nos com cenas intermináveis de diálogo entre um grupo de três amigas. Aqui Tarantino parece ter-se contido e reprimido alguns dos seus instintos no que toca a diálogo, o que é louvável. Ao serviço do filme, as personagens não debitam referências pop-culturais ou entram em discussões Seinfeldianas. São apenas pessoas normais num dia como tantos outros das vidas delas, com conversas banais. Isto tem um resultado soberbo, que é o de lhes atribuir inocência. Não estamos perante personagens gigantes, bem trabalhadas e únicas. Estamos perante pessoas como as que conhecemos no nosso quotidiano. Há uma maior identificação da audiência com estas pessoas do que com um gangster tocado por um acto divino ou com uma mercenária que regressa da morte para se vingar.

É na altura em que já consideramos estas pessoas nossas conhecidas que aparece o verdadeiro protagonista do filme e mais um papel lendário para Kurt Russell, Stuntman Mike. Stuntman Mike é um falhado, um homem a envelhecer, com uma carreira insignificante que já deu de si, e sem nenhum tipo de jeito a engatar miúdas. É uma personagem fascinante de tão remendada que é.

Quando a violência chegou, foi possivelmente o ponto mais alto da minha experiência em cinemas este ano. Não demora mais de três minutos, mas é executada de uma forma tão brilhante e ao mesmo tempo sádica que se torna inesquecível. Uma colisão entre dois carros é-nos apresentada com replays do ponto de vista de cada um dos prestes-a-ser cadáveres num dos carros. A partir do momento em que reparamos que o que estamos a ver é um replay, já sabemos que vem aí um por cada passageiro. E essa expectativa torna a experiência ainda mais cruel. Brilhante.


"Pessoal, não olhem agora mas o Snake Plissken está a seguir-nos"


Após esta sequência e após um interlúdio para acalmar a tensão, somos apresentados a um segundo grupo de raparigas. Há alguns paralelos com o primeiro grupo, mas será vão compará-los. Mesmo sendo submetidos a mais um período de adaptação às pessoas. Mesmo aparecendo Stuntman Mike com toda a sua (agora) ameaça justamente quando as conhecemos. Isto porque, após uns momentos de tensão cortante à antiga (às vezes é mais simples criá-la sem usar demasiados efeitos), as presas voltam-se contra o seu caçador. A partir daqui é girl power por toda a duração de uma belíssima perseguição automóvel.

Uma perseguição que nos leva a uma conclusão onde justiça é administrada, onde o vilão tem espaço para mostrar o quão pequeno é, no fundo.
DEATH PROOF é algo de bastante novo, feito em moldes antigos.

Vale mesmo a pena ver, e ainda está em algumas salas no país. Com alguma sorte vão poder vê-lo a seguir à estreia de PLANET TERROR.


Vão vê-lo com: Maus condutores, seguidores de telenovelas da Globo

O Esquartejamento de GRINDHOUSE Parte 1
PLANET TERROR, de Robert Rodriguez



Numa certa reunião, num escritório de luxo algures em Los Angeles: "Queremos fazer um filme. Aliás, dois filmes. Mas só queremos que se venda um bilhete por ambos. Vão ser restritos a audiências com mais de 18 anos, vão ter muita nojice e muita violência, e vamos esforçar-nos que fique com um aspecto rasca. Aliás, vamos mesmo fazer de conta que a fita está estragada e coisas giras desse género."

Este não é de certeza o tipo de premissa que os irmãos Weinstein estariam habituados a ouvir, e certamente que não é o tipo de projecto no qual eles investiriam milhões de dólares. Mas a diferença é que quem estava a propôr a ideia eram Quentin Tarantino e Robert Rodriguez, as galinhas de ouro da dupla de produtores americanos.
Foi assim que nasceu GRINDHOUSE, uma double feature que pretendia homenagear os filmes exploitation que numa altura teriam abrigo no Sá da Bandeira. A acompanhar DEATH PROOF e PLANET TERROR vieram ainda quatro trailers falsas com o mesmo âmbito.

Porém, GRINDHOUSE não fez diheiro nenhum nos EUA. As razões são inúmeras: fraca campanha publicitária, pouco contexto, conceito demasiado niche, material demasiado ofensivo, etc. Isto levou a que os Weinstein se zangassem com as suas galinhas de ouro e simplesmente abortassem planos de distribuição noutros mercados.
Valeu-nos o cut internacional que Tarantino apresentou em Cannes, já que por também estrear no Festival de Curtas de Vila do Conde vamos receber ambos os filmes Grindhouse no nosso país. Não vamos ter direito à experiência da double feature, e trailers falsas nem cheirá-las, mas podia ser pior.


Um dos sintomas de exposição ao gás tóxico é o de delírio na compra de casacos


PLANET TERROR

Se DEATH PROOF é uma carta de amor a filmes exploitation, então PLANET TERROR é um homem das cavernas a rebentar o crânio da exploitation com uma moca e a tomá-la como noiva. Rodriguez libertou aqui todos os seus instintos de gore e de B moviemaking, e juntou-os numa embalagem que morde e que cospe. É um testemunho da selvajaria deste filme o facto de haver cameos de pessoas tão distintas como Fergie e Tom Savini.

Na pequena cidade no Texas, uma troca entre um grupo de militares e um cientista corre mal, resultando na libertação de um perigoso gás. Este gás vai tornando a população em criaturas deformadas e sedentas de carne humana (não usemos aquela palavra que começa por Z). À medida que a epidemia cresce, o decrescente número de sobreviventes aglomera-se num grupo que se apercebe que tomar a base militar da zona é a sua última hipótese de sobrevivência.

PLANET TERROR tem uma mão mais pesada com as simulações de fita estragada do que DEATH PROOF. E este é apenas mais um sintoma das diferenças entre as duas apresentações. PLANET TERROR é mesmo muito liberal com a violência, mas tanto esse aspecto como o humor negro com que a violência é encarada tornam-na mais do que tolerável - tornam-na gira. Quando chega a altura de Rose McGowan chacinar soldados mutantes com uma carabina M4A1 em vez de uma perna, é só um arco natural.

É uma escolha óbvia que PLANET TERROR tenha sido a abertura para GRINDHOUSE. Depois de hora e meia de excesso e grand guignol, a audiência já saciou as suas expectativas, está preparada para digerir a próxima metade da experiência com mais método. Está pronta para DEATH PROOF.


Vão vê-lo com: Fãs dos Black Eyed Peas, o cunhado que costumava arrancar as asas a moscas


Ler Parte 2

sábado, setembro 22

Correr Quando Outros Andam
THE BOURNE ULTIMATUM, de Paul Greengrass



Estreou esta semana em Portugal "Ultimato" a última parte da trilogia de Paul Greengrass baseada nos livros de Robert Ludlum. O grosso deste terceiro filme descreve o percurso de Jason Bourne desde o final do segmento na Rússia em Bourne Supremacy até ao momento no final desse filme em que ele chega a Nova Iorque. Pelo caminho, mais backpacking pela Europa e um saltinho a Tânger.

É um crédito para Paul Greengrass que esta trilogia se tenha mantido tão constante na sua abordagem sem parecer repetitiva ou aborrecida. O personagem principal continua lacónico, estóico e introspecto, mas nunca conseguimos desviar o nosso olhar dele. É esta a principal qualidade da visão de Greengrass para o personagem, a subtileza com que o estado emocional e a atmosfera são comunicados à audiência. Matt Damon tem aqui uma tarefa considerável ao mostrar as motivações e processos de raciocínio de Bourne sem dizer uma palavra.

Com Bourne claramente apontado como uma influência no reboot da franchise Bond (aliás, o coordenador de luta corpo-a-corpo dos filmes Bourne foi contratado para o próximo filme 007), Ultimato refina aqui aqueles elementos que destacaram os anteriores. Neste universo há uma clara divisão entre os soldados e os empregados, entre aqueles que sabem o seu ofício e aqueles que são descuidados. Embora estejamos a presenciar actos e acrobacias mirabolantes, nunca chegamos a duvidar que com dedicação e treino aquele tipo de rapidez de raciocínio e de movimentos seria possível. Foi mais ou menos aqui que sempre circulou a principal queixa aos filmes Bourne, nomeadamente no que toca ao uso da "shaky cam". Mas de facto Greengrass controla-se mais em Ultimato, dá-nos uma maior noção de espaço e somos capazes de ver todos os movimentos de coreografia das lutas corpo-a-corpo.

De resto, pouco se poderá dizer acerca da conclusão da história sem revelar demasiado. Chega dizer que Jason Bourne encontra aqui não só respostas como também uma chamada à sua responsabilidade. Sendo que para além de respostas sobre o seu passado Bourne sempre procurou emancipação deste, é de notável maturidade que o filme lhe apresente um custo.

Quando Bourne Ultimatum acaba, podemos chegar a perguntar-nos se houve suficiente substância para três filmes. Mas, por quaisquer critérios, esta trilogia mais do que justificou o seu espaço.


Vão vê-lo com: Pessoal que ainda se lembra do Matt Damon de TEAM AMERICA, pessoal que acha que o mais recente Bond é bastante original

Sem medo do Escuro

Precisamente por ser um blog sem nenhum tipo de presunção ou pomposidade, o primeiro post não vai ser um mission statement. Nem vai ser uma citação de um filme clássico-barra-obscuro.

Não vai ser uma crítica ácida com ares de superioridade. Nem vai ser sequer um agradável texto de introdução.

O primeiro post não vai ser uma perda de tempo.

O primeiro post é este.